Assistência de enfermagem em distúrbios metabólicos e endócrinos


Fonte: folha jovem

No corpo humano, o sistema endócrino é constituído por um número de glândulas que produzem diversos hormônios que regulam as várias funções do corpo. Esse sistema controla todos os processos que ocorrem no nosso corpo desde, por exemplo, o crescimento de uma célula, à frequência cardíaca ou mesmo temperatura corporal. Como tal os distúrbios endócrinos são resultado do mau funcionamento desse sistema, isto é, essas alterações ocorrem quando uma ou mais glândulas não estão a funcionar da forma devida verificando-se uma anomalia na produção de hormônios. São exemplos de distúrbios endócrinos: diabetes mellitus, distúrbios da tireoide, dislipidemias, entre outros. O primeiro distúrbio que iremos ver nesse post é a Diabetes Mellitus, mas antes vamos revisar a fisiologia das estruturas relacionadas a essa patologia.

Começando pelo pâncreas que tem função glandular tanto exócrina por meio de enzimas digestivas quanto endócrina através da produção de insulina e do glucagon que juntos mantêm um nível relativamente constante de glicemia. Sendo mais especifica, a insulina é um hormônio necessário para o metabolismo de glicose, sua ação diminui a glicose e permite a entrada dela nas células do fígado, músculos e outros tecidos onde fica estocada sob a forma de glicogênio ou é queimada para produzir energia. Mas o que é metabolismo? Entendemos por metabolismo a soma de todas as reações químicas que ocorrem na célula com a finalidade de produzir energia através da ação de enzimas sendo chamado de anabolismo o processo de formação de novas moléculas e catabolismo a quebra de moléculas e eliminação de substâncias desnecessárias. Sendo assim a insulina um hormônio anabólico ou de reserva onde a sua quantidade produzida vai depender da quantidade de açúcar ingerido então quando uma feição rica em açúcar é ingerida a secreção de insulina aumenta e move a glicose do sangue para o fígado, músculos e células gordurosas. Aposto que você já se perguntou qual a diferença entre glicemia e glicose não foi? Depois desse post você nunca mais vai esquecer. Glicemia é a concentração de glicose no sangue, sendo mais precisa, no plasma onde a glicose é a principal fonte de energia do organismo e seu excesso ou falta resulta em várias complicações.
Fonte: Professor Romario

Mas qual é o papel do glucagon? Ele possui efeitos opostos ao da insulina, enquanto a insulina diminui a produção de glicose o glucagon eleva a glicemia por meio da estimulação da gliconeogênese assim convertendo o glicogênio em glicose no fígado. O glucagon é secretado em resposta a uma queda de glicemia para ajudar manter os níveis de glicose no sangue ao se ligar aos receptores no fígado consequentemente liberando a glicose armazenada na forma de glicogênio através do processo de glicogenólise. Agora que entendemos a função do sistema endócrino, o que é metabolismo e o metabolismo da glicose podemos falar sobre a Diabetes Mellitus (DM).
A Diabetes Mellitus é uma doença metabólica caracterizada por um aumento anormal da glicose ou açúcar no sangue o que chamamos de hiperglicemia. Estima-se que cerca de 6% da população mundial é diabética, patologia caracterizada pela capacidade diminuída do corpo em responder à insulina (Diabetes tipo dois) ou o pâncreas pode parar de produzir insulina (Diabetes tipo um). A DM é classificada como tipo 1, tipo 2 e gestacional. Sendo que a Diabetes Mellitus tipo 1 pode se manifestar de forma autoimune ou idiopática. A DM tipo 1 presente em 5% a 10% dos casos de diabetes é o resultado da destruição de células beta pancreáticas com consequente deficiência insulínica onde a taxa de destruição das células beta é variável sendo mais rápida entre as crianças e adolescentes podendo ocorrer em adultos à forma lentamente progressiva a qual se refere como diabetes autoimune latente do adulto (LADA). Na maioria dos casos a DM tipo 1 se manifesta de forma autoimune, ou seja, o sistema imune ataca as células betas do pâncreas, células estas produtoras de insulina, onde a presença de alguns anticorpos anti célula b, por exemplo, podem ser detectados meses ou anos antes do diagnostico clinico após detectar hipoglicemia. Já a forma idiopática é diagnosticada nos casos em que não há evidencias de processo autoimune, isto é, quando há ausência de marcadores autoimunes contra as células betas. O traço clínico que mais define o tipo 1 é a tendência à hiperglicemia grave e cetoacidose (CAD).
A cetoacidose é uma complicação metabólica grave da DM1 causada pela deficiência relativa ou absoluta de insulina associada ou não a uma maior atividade dos hormônios contrarreguladores como o cortisol, glucagon e hormônio do crescimento. Nessa complicação ocorre acidose metabólica que é uma acidez excessiva do sangue e fluidos corporais por formação de corpos cetônicos que são ácidos que acumulam na circulação devido à falta de insulina.  Tendo como manifestações clinícas: desidratação, respiração acidótica chamada respiração de kussmal que é caracterizada por uma respiração rápida e profunda) e laboratorialmente são achados glicemia superior a 250mg/dL, pH inferior a 7,3 caracterizando uma acidose metabólica, bicarbonato sérico inferior a 15mEq/l, cetonas totais superiores a 3 mmol/l (cetonemia) e a presença de corpos cetônicos na urina (cetonúria). A investigação de enfermagem na assistência de um paciente diabético com sugestivo de cetoacidose se inicia na anamnese com o questionamento sobre os hábitos do paciente, controle do DM, se há presença de sede excessiva (polidpsia), poliúria, inapetência, náuseas e vômitos, cólica abdominal, fadiga, fraqueza e sonolência além da presença da respiração de Kussmaul, hálito cetônico, desidratação, distensão abdominal, mucosa ressecada, pele ruborizada, diminuição do turgor e da perfusão tecidual, hipotensão, taquicardia e alteração na responsividade. Os exames laboratoriais são Exames complementares são gasometria arterial, bioquímica, função renal, urina I/URC, glicemia, glicosúria e cetonúria.
Já na Diabetes Mellitus tipo 2 que é mais comum em indivíduos com idade igual ou superior a 40 anos ocorre à produção de insulina, mas por algum motivo as células são resistentes à ação da insulina ou não produzem insulina suficiente. Esse tipo de DM caracteriza-se pelo déficit na ação e secreção de insulina como também na regulação hepática de glicose ocorrendo à hiperglicemia de forma mais branda e lenta permanecendo assintomática por vários anos. A etiologia desconhecida, porém alguns fatores etiopatogênicos são contribuintes como os fatores genéticos (história familiar) e ambientais (obesidade e sedentarismo). Na diabetes tipo 2 a presença de cetoacidose é rara ocorrendo apenas quando está associada a outras condições como infecções isso porque há produção suficiente de insulina para evitar a degradação de gordura e subsequente produção de corpos cetônicos. Como a resistência a insulina está associada à obesidade, o tratamento primário é a mudança do estilo de vida, perda de peso, exercícios para aumentar a efetividade da insulina e uso de agentes hipoglicemiantes orais prescritos como também o uso de insulina em casos necessários. 
A DM2 pode resultar no Estado Hiperglicêmico Hiperosmolar (EHH) que é caracterizado por hiperglicemia e hiperosmolaridade sem cetoacidose. O principal sintoma do EHH é uma alteração no estado mental, onde pode ocorrer uma confusão leve até mesmo o individuo entrar em coma, outros sintomas que podem se manifestar antes da alteração no estado mental é a micção frequente e sede extrema. Sendo as causas frequentes: infecção, uso de corticoides (aumentam o nível de glicose) e Acidente Vascular Encefálico (AVE) tendo como sintomas a poliúria, polidipsia, desidratação, nível de consciência alterado, confusão e coma. A investigação de enfermagem se caracteriza por uma anamnese bem feita com o questionamento sobre os hábitos de vida, controle da DM, se há presença de polidipsia, poliúria, inapetência, fraqueza e sonolência progressiva bem como achados no exame físico: desidratação, mucosa ressecada, diminuição do turgor, hipotensão, taquicardia, alteração do comportamento, confusão e nos exames clínicos: glicemia superior 600 mg/dL e glicosúria.
Fonte: Physics&Health

Outro tipo de diabetes é a DM gestacional que é caracterizada por altas taxas glicêmicas ocorridas em gestantes que não têm diabetes.  Surge entre a 24ª e a 28ª semana de gravidez período com produção de grandes quantidades de hormônios que bloqueiam a insulina assim quando algo no organismo impede a insulina de desempenhar sua função caracteriza-se uma resistência à insulina. A mulher corre maior risco de ter diabetes gestacional se um ou mais dos fatores a seguir estiver presente: 25 anos de idade ou mais, estiver acima do peso, histórico familiar de diabetes e ter dado à luz um bebê de peso igual ou superior a 4,5kg. O diagnóstico é dado através do exame de diabetes gestacional entre a 24ª e 28ª semana de gestação e se diagnosticado deve se iniciar o tratamento o mais rápido possível onde a gestante deve seguir um plano alimentar, seguir um programa de exercício físico, monitorar a glicemia, verificar a presença de cetonas na urina e tomar insulina prescrita.

Só para vocês entenderem os termos técnicos usados anteriormente:
  •  Hiperglicemia: excesso de glicose no sangue;
  • Glicosúria: se a glicose no sangue for suficientemente alta, os rins podem não reabsorver toda a glicose filtrada, então aparece na urina;
  •  Diurese osmótica: quando um excesso de glicose é excretado na urina, ele é acompanhado por perda excessiva de líquidos e eletrólitos;
  •  Polidpsia: aumento da sede;
  • Poliúria: como resultado do excesso da perda de líquido, ocorre um aumento do volume da urina;
  • Polifagia: os indivíduos podem ter um aumento do apetite devido à reserva diminuída de calorias.


De modo geral os cuidados de enfermagem são investigar hábitos de vida (alimentação, sono e repouso, atividade física, higiene, funções fisiológicas), identificar fatores de risco (tabagismo, alcoolismo, obesidade, dislipidemia, sedentarismo), estimular e auxiliar o paciente a desenvolver seu plano de autocuidado em relação aos fatores de risco identificados, verificação de glicemia em jejum, administração de hipoglicemiantes e insulina conforme prescrição. E os cuidados específicos para as complicações são hidratação através da reposição hídrica (Nacl 0,9% ou Ringer Lactato), reposição de insulina, correção dos distúrbios eletrolíticos, reposição eletrolítica (Potássio e Fósforo), correção da acidose metabólica e administração de Bicarbonato em casos graves. 
Agora vamos falar sobre outros distúrbios endócrinos: os distúrbios da tireoide. A tireoide é uma glândula em formato de borboleta, localizada na base do pescoço, à frente da traqueia e logo abaixo da cartilagem tireoide (mais conhecida como pomo de adão) ela produz dois hormônios chamados triiodotironina e tiroxina, mais conhecidos como T3 e T4, respectivamente. Esses hormônios são os responsáveis pelo metabolismo do corpo, ou seja, o modo como o organismo armazena e gasta energia. Quando há excessiva eliminação de hormônios tireoideanos à estimulação anormal da glândula tireoide por imunoglobulinas circulantes denomina-se hipertireoidismo que possui as seguintes manifestações clinicas: nervosismo, irritação, apreensão, pulso rápido em repouso, transpiração e rubor constante, leve tremor das mãos, aumento do apetite com progressiva perda de peso, fadiga, fraqueza muscular. Há assistência de enfermagem para esse distúrbio inclui o monitoramento da frequência cardíaca (FC) e da pressão arterial (PA), o registro do padrão de sono e orientação de repouso além de evitar a estimulação física excessiva como também incentivar o aumento da ingesta calórica. Já o hiportireoidismo ocorre quando a tireoide não secreta uma quantidade adequada de hormônios tireoideanos nesse caso as manifestações clinicas incluem forte fadiga, queda de cabelo, unhas frágeis, pela ressecada, dormência e formigamento nos dedos, mixedema, voz rouca, ganho de peso, desequilíbrio da temperatura corporal, constipação e a assistência de enfermagem inclui a orientação do repouso, avaliação  da temperatura corpórea, explicar a necessidade da terapia hormonal e fornecer alimentos ricos em fibras.
Fonte: Hospital Santa Lucia

O último distúrbio a ser abordado nesse post são as famosas dislipidemias onde com os triglicerídeos alto e /ou HDL- colesterol baixo, costumam fazer parte do quadro clínico da síndrome metabólica. São caracterizadas pela elevada presença de gordura no sangue, esta é uma doença que apresenta um elevado risco cardiovascular, uma vez que a gordura se acumula nas paredes das artérias. Tem como causas dislipidemias primárias (sem causa aparente), origem genética, hábitos de vida como o sedentarismo e a dieta, podem ser originadas a partir de outras doenças como: diabetes mellitus, obesidade, hipotireoidismo e insuficiência renal. As dislipidemias podem ser classificadas em: 

Fonte: nisia digital



  • Hipercolesterolemia isolada: elevação isolada do LDL colesterol (igual ou maior que 160 mg/dL);
  • Hiperlipidemia mista: valores aumentados de ambos LDL colesterol (igual ou maior que 160 mg/dL) e Triglicerídeos (igual ou maior que 150 mg/dL);
  • GHDL-colesterol baixo: redução do HDL-colesterol (homens abaixo de 40 mg/dL e mulheres abaixo de 50mg/dL) isolada ou em associação com aumento de LDL colesterol ou de triglicerídeos.


As dislipidemias tem como manifestções clínicas: a disfunção ou lesão endotelial, a penetração e acúmulo de lipídios na intima arterial, e a adesão de macrófagos e plaquetas ao endotélio com liberação de fatores de crescimento. O tratamento consiste na modificação do estilo de vida através da prática de exercício físico regular, manutenção do peso ideal e combate ao tabagismo, modificações da alimentação por meio de uma dieta pobre em colesterol e gorduras saturadas ao mesmo tempo rica em fibras evitando uma dieta aterogênica e também com a terapia medicamentosa prescrita através de estatinas, as resinas de troca, o ácido nicotínico e os inibidores seletivos da absorção do colesterol.



REFERÊNCIAS UTILIADAS
  1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica.Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica : diabetes mellitus / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2013. 160 p. : il. (Cadernos de Atenção Básica, n. 36.
  2. Grossi SAA. O manejo da cetoacidose em pacientes com Diabetes Mellitus : subsídios para a prática clínica de enfermagem. Rev. esc. enferm. USP [serial on the Internet]. 2006 Dec [cited 2014 Nov 26] ; 40( 4 ): 582-586. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342006000400019&lng=en. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342006000400019.
  3. Neto DL, Pires AC. Crises hiperglicêmicas agudas no diabetes mellitus. Aspectos atuais. Rev Bras Clin Med 2010;8(3):246-53.
  4. Oliveira JEP, Venâncio S. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes: 2015-2016/Sociedade Brasileira de Diabetes. São Paulo: AC Farmacêutica, 2016. Disponível em: http://www.diabetes.org.br/sbdonline/images/docs/DIRETRIZES-SBD-2015-2016.pdf.

2 comentários: